O que é que pode fazer o homem feliz?

Andrea Simoncini – o primeiro orador dos encontros que o Meeting Lisboa propõe este ano para refletir sobre os capítulos d’A Beleza Desarmada [1]– partiu desta pergunta para falar da Europa dos nossos dias.
Inês Avelar Santos

Começa por comentar que as palavras que fundaram a Europa, sobretudo a palavra liberdade, são hoje usadas por todos, mas cada um lhe dá significado diferente. Portanto, diz, “ninguém se entende!”. O Iluminismo e, mais recentemente, as revoluções do nosso século trouxeram-nos uma ideia adolescente da liberdade: “para ser livre preciso de cortar todas as relações, não depender de ninguém, auto determinar-me, isto é, não devo a ninguém a minha felicidade”. Daqui nasce a pretensão de novos e sempre mais direitos, que garantam ao homem a possibilidade de se auto determinar.

Mas se é verdade que a liberdade tem uma dimensão de ausência de constrangimentos, devemos ainda responder a esta pergunta: “Se eu acabar com todos os meus constrangimentos, cortar todas as minhas relações, terei então aquilo que o meu coração procura?”.

Aqui chegado, o Constitucionalista italiano convida-nos a lembrar o aspeto mais decisivo da experiência humana: “para ser feliz tenho necessidade de ser querido! Há um último ímpeto que afirma a nossa dependência, acima de todas as tentativas de sermos autónomos”. Há um hetero, algo diferente fora de nós, mas, também um hetero dentro de nós que afirma esta nossa dependência.

E isto é verdade quer a nível individual, quer a nível coletivo – um povo não pode aceitar o que é diferente dele se não reconhece que ele próprio deve a sua unidade a outra coisa. O que vale para o fenómeno Brexit, Catalunha ou Escócia… “Se refletirem, é um bocado paradoxal. Os que estão melhor, porque se querem separar, desligar? Se foi estando juntos com os outros que se tornaram melhores? Evidentemente, é esta a ideia de fundo. Nós não queremos reconhecer alguma coisa que nos liga aos outros mais necessitados. Não queremos reconhecer que se estamos melhor é por causa de uma ligação”.

Falsas promessas. Para Carrón, realça o orador, o drama da nossa cultura não está no facto de que ao homem tudo é permitido, mas nas falsas promessas e na ilusão que essa permissividade traz consigo. A necessidade de liberdade que o homem procura satisfazer - e que está na origem destes direitos - é um ímpeto justo do coração de todos os homens. No entanto, não é verdade que o único modo de satisfazer tal desejo seja a pretensão, isto é, um direito sobre o outro.

Falando para uma audiência de estudantes, jovens trabalhadores, bispos, professores universitários, juízes e advogados, realça: “O Estado ocupa espaço porque não há sociedade que lhe ponha um travão! Onde existe um sujeito e uma comunidade, as pretensões do Estado de conquistar a legitimação encontram um limite. Isto é o que devemos desejar para todos nós! Um lugar onde as pessoas possam dizer EU, onde possam ser sujeitos capazes de afirmar a sua pertença.”

Voltar ao início. Esta luta entre conceções diferentes de liberdade é o indício de uma carência profunda da Europa. A consciência de que a liberdade não pode ser só a liberdade de, mas que é uma liberdade para. Eu sou livre se tenho uma relação com quem me faz feliz!

Por isso qual será o novo início da Europa? Para Simoncini, algo como a experiência do filho pródigo! Depois de ter feito tudo o que de pior se podia fazer a um pai, o filho volta a casa. E antes que consiga abrir a boca – para se justificar – o Pai está feliz e abraça-o! [A modernidade quer reagir a este abraço do pai, dizendo: “Não! Eu não devo voltar. A minha liberdade é não voltar!” É fugir a este abraço.] Só uma experiência de relação assim – agora! – é capaz de dar ao homem esta abertura da liberdade. Também a nível coletivo… ou somos capazes de viver de novo a experiência de relação da qual nascem os valores ou, se pusermos a nossa esperança só na batalha dos valores, já perdemos à partida.

A Verdade é uma relação. Comentando esta frase do Papa Francisco, Simoncini alerta: “A conversa dos valores não atrai ninguém!”. Como nos disse o Papa, “Nós (quem encontrou a experiência cristã) encontrou Alguém que disse Eu sou a Verdade. Não disse, “aquilo que eu penso é a verdade”, não disse “aquilo que vos deixo escrito é a verdade”. Disse: “Eu sou a Verdade”. E se tivesse dito só isto, estaríamos em maus lençóis. Mas Ele disse, “Eu sou a Verdade” e “Estou convosco todos os dias”. Por isso, a Verdade é uma relação. Mas não uma relação no passado.”

O Professor Andrea Simoncini deixou-nos inúmeros pontos de reflexão para futuros encontros. Para já, o comum ouvinte terá talvez saído a pensar: “Onde e por quem me senti abraçado como o filho pródigo...?”.


[1] De Julian Carrón, Lucerna, 2016.