Uma rua de Lisboa

LISBOA. «Aquelas senhoras e o que torna a vida belíssima»

No Colégio São Tomás, algumas senhoras que cuidam da limpeza pedem para receber a Primeira Comunhão. É o começo de uma amizade para Luísa, a catequista, em que «se joga tudo, sem tabus»

Tudo o que me acontece é fruto deste lugar, do encontro com esta companhia de pessoas que é a igreja, onde tive a graça de reconhecer Jesus ressuscitado.
Um coração que arde pela Beleza do ressuscitado, procura Jesus em todos, é isso que me move.

Sou catequista no Colégio de São Tomás em Lisboa e nas Primeiras Comunhões, um aluno mesmo antes de receber Jesus dizia-me: “Estou tão ansioso!”. Olhando-o pensei que é assim que quero acordar de manhã em cada dia, verdadeiramente desejosa de encontrar Jesus e desejo que o mesmo aconteça a cada aluno do CST, a cada pai, a cada mãe... .

Isto fez com que fosse trabalhar todos os dias com o desejo de que o colégio se torne num lugar onde seja possível encontrar Jesus.
Percebi que o meu horizonte não podia ser só os alunos, mas também as famílias e todos os que trabalham no colégio, um verdadeiro entusiasmo pela presença de Jesus incendeia todos aqueles com quem nos cruzamos e gera uma verdadeira comunidade. Esta é a beleza que salva o mundo! Por esta beleza dá gosto e vale a pena dar a vida!

Num dos colégios onde dou catequese trabalham 5 destas senhoras que fazem a limpeza e cuidam da beleza do colégio. Comecei por de tempos a tempos ir almoçar com elas. Um dia enquanto preparava as primeiras comunhões, perguntei-lhes se todas elas já tinham feito a primeira comunhão. Três delas não tinham. Então perguntei-lhes se não gostavam que eu as preparasse. Como não sabiam o que responder disse para irem pensando sobre o assunto. Pouco tempo depois disseram que sim.

Comecei a dar-lhes catequese. No início a distância entre nós era grande, foi um embate enorme com o mundo real, feito de quotidianos difíceis e famílias com problemas vários... cada assunto que era abordado surgia sempre a mesma pergunta: O que tem de mal? Ali jogava-se a vida toda, nada era tabu... muito se chorava e ria.

Neste caminho, delas e meu, impressionava-me nada disto beliscar a nossa amizade. Muitas vezes não compreendiam, pois era uma novidade gigantesca que entrava pela vida delas, e era um presente para mim poder contemplar a força de Jesus ressuscitado.
Mais tarde quis juntar-se mais uma senhora, pelo que lhe contavam as outras. Veio ter comigo e disse: Eu já fiz a 1ª comunhão, mas não me confesso há 20 anos e gostava também de ter catequese.

Uma das Senhoras tinha uma situação de vida em que não podia fazer a primeira comunhão. A outra dizia-me: “Se ela não fizer a Primeira Comunhão, eu também não faço! Somos tão amigas que temos de fazer juntas!
O tempo foi passando...

Decidiu fazer a 1.ª comunhão para mim no dia mais caótico. Tinha várias mães a entrar e a sair da minha sala porque estávamos à preparar a Exposição para o Open Day do colégio. Nesse dia até fizemos a catequese de pé, pois havia também várias crianças a fazer trabalhos na sala e não havia cadeiras.

A dada altura, dominada pela beleza daquela comunidade que invadia o nosso espaço, disse-lhe que ser amiga não é não fazer a primeira comunhão porque a nossa amiga não faz, isso era antes a maior estupidez, devia antes aproveitar a oportunidade de ficar mais perto de Jesus e rezar por essa amiga. Nós precisamos da companhia uns dos outros mas a resposta diante de Deus é pessoal, e ela tinha a graça de poder caminhar numa amizade mais intima com Jesus, como podia ela não aproveitar semelhante tesouro?

Olhou para mim muito séria e comovida e respondeu: Sim eu quero!
Percebi que a maneira como Jesus olha tudo é tão diferente da minha, mesmo naquele dia que eu não achava possível acontecer nada, o imprevisto irrompeu com toda a sua força. Era a experiência de uma novidade irredutível A experiência do anúncio que remete para a conversão.

Um dia ensinei-lhes o Ato de contrição e no dia seguinte, uma delas veio à minha sala e disse: “Eu não posso rezar isso proponho firmemente emendar-me e nunca mais vos tornar a ofender... isso é mentira, eu não sou capaz!” Fiquei mais uma vez grata diante de alguém que me chamava a atenção para aquilo que eu que me confesso todas as semanas dou por adquirido, alguém que me punha diante do Senhor,
Outras vezes, irrompia pela minha sala e dizia: “Pequei mas não estou arrependida. E agora?”

Chegou o dia da Primeira Comunhão. Este acontecimento tocou toda a comunidade: as educadoras juntaram-se para organizarem um coro, fizeram presentes, santinhos para oferecer...
No fim da missa outra senhora da limpeza disse-me: Achei tudo tão bonito, tão verdadeiro e tão simples que decidi também preparar-me para a 1ª comunhão. Posso juntar-me ao grupo?

Entre nós nasceu uma amizade impensável. Por vezes chamamo-nos umas às outras para ir à capela rezar uma oração e fazer companhia a Jesus... e a catequese continua para todas, mesmo para aquelas que já fizeram a Primeira Comunhão pois queremos estar juntas! E eu descobri que a vida é muito mais bela do que alguma vez tinha imaginado, tornei-me mais certa da vida eterna pela realidade que vivo agora e sei que pertenço ao Senhor... e tudo o que vivo só é possível por esta alegria igual à dos discípulos de Emaús, que experimento por pertencer ao movimento através da companhia de rostos concretos que todos os dias sustentam e tornam belíssima a minha vida.

Luísa, Lisboa