Ligar os gestos à origem
Publicamos o testemunho de um amigo sobre o encontro de fraternidade e o gesto das tendas de NatalNo fim de semana de 16 de dezembro tive encontro de Fraternidade, em que nos juntámos com as famílias, incluindo crianças, para um jantar de Natal em casa de uns amigos. A certa altura após o jantar, um de nós pegou na viola e começou a cantar algumas músicas com algumas das crianças presentes. Não estava nada previamente combinado. Aos poucos os adultos e restantes crianças começaram todos a juntar-se e a cantar as músicas que iam sendo propostas. Alguém propôs cantar uma música e enviá-la em vídeo para uma amiga nossa que estava em casa doente, outra para o Pe João, outra ainda para uma amiga que não tinha podido ir. Acabámos por estar a cantar todos juntos durante bastante tempo. Foi um serão belíssimo, daqueles em que estávamos cheios de contentamento por dentro e do qual não apetece acabar. Mas ao mesmo tempo, com o avançar da hora e da evidente necessidade de voltar para casa, percebi-me também contente por ir para casa após um momento tão belo e tão cheio como esse, com vontade de abraçar o dia seguinte dominado por aquilo que tinha acontecido e que levava em mim. Estava comovido e grato.
No dia seguinte fui às tendas de Natal da AVSI. Tinha-me inscrito pensando que iríamos todos em família, mas como um dos miúdos ficou com febre e estava um dia bastante frio, acabei por poder ir só eu. O movimento de me decidir a ir custou-me, não me apetecia, estávamos a uma semana do Natal e ainda tinha várias coisas para tratar, a modalidade já não iria ser a inicialmente planeada, e abordar pessoas na rua era uma tarefa pouco apetecível. Mas lá fui, a custo. Quando cheguei e vi apenas uma mesinha simplicíssima, praticamente escondida, ainda fiquei mais desmotivado; como iria fazer? Aquilo mal se via… Mas aos poucos comecei a falar com cada pessoa que passava, a entregar o panfleto, e fui-me descobrindo cada vez mais livre e contente com o que estava a fazer. A mesa já não era importante. Aliás, até me fazia sorrir. E comecei a pensar que se eu fosse abordado daquela forma por alguém, muito provavelmente não contribuiria e se calhar até tentava “fugir” rapidamente, tal como grande parte das pessoas estava a fazer comigo. E isso fez-me não estar pretensioso com a reação de cada um, antes comecei a dar por mim espantando e comovido cada vez que alguém me ouvia com atenção ou até contribuía com alguma coisa. E de repente veio-me também à memória o serão da noite anterior e aquela alegria que tinha tido e que estava a voltar a acontecer-me. Quando fui rendido pelo turno seguinte, estava contente, livre, em paz, e comovido.
Quando à noite desse dia fui preparar a EdC da semana seguinte, reparei na indicação do Carrón em avaliarmos o nexo do texto com a experiência que tivéssemos feito no Banco Alimentar e nas Tendas, e que esses gestos não fossem desligados da origem. E percebi que a experiência que tinha tido no encontro de Fraternidade estava profundamente ligada à experiência que tive nas Tendas. Muito provavelmente, se não tivesse estado naquele encontro, não teria estado com a liberdade e a alegria com que me descobri nas Tendas. Percebi que aquilo que me tinha acontecido tinha sido precisamente viver a experiência das Tendas ligada à origem, àquele encontro e àquele lugar que me enchem o coração e onde aprendo a viver e a ser feliz. E, ao mesmo tempo, a experiência das Tendas permitiu levar ao mundo esse encontro e esse lugar.
Francisco, Lisboa