Uma pergunta para a vida

Na introdução dos Exercícios da Fraternidade o Padre Carrón dizia-nos que «À luz da Ressurreição podemos olhar de frente para a pergunta mais urgente do homem: vale verdadeiramente a pena ter nascido?»

Na minha vida renovo esta pergunta em cada manhã, naquele primeiro instante em que a fadiga ainda não deu lugar à consciência de um Outro que me faz agora.

É nesse instante que, em cada manhã, se joga a minha liberdade, não cedendo à tentação de ficar no meu limite e, pelo contrário, começar o dia com uma oração, um pedido, uma súplica para que eu O reconheça. Depois uma entrega, procurando acolher o que Ele me der. É com este olhar que procuro viver, estando atenta para não deixar passar despercebidos tantos pequenos milagres quotidianos que o Senhor me dá, por exemplo um lugar à sombra num dia de 30 graus, o um sorriso ou brilho no olhar de uma colega que sabemos em dificuldade, o empenho de um colega de trabalho, o carinho da minha família.

É assim que tenho vivido a doença incurável de uma prima, de 55 anos, que tem esclerose lateral amiotrófica e já não consegue falar, andar, comer, estando internada num centro hospitalar. No início da doença a minha prima só desejava morrer. Neste cenário de dor, os amigos e família tinham a tentação de a consolar, chorando e lamentando a sua situação. Provocada por tudo isto, eu apenas rezava e pensava que Jesus nunca nos abandona, procurando não ser moralista mas também não dizendo apenas “coitadinha” ou “tens de ser forte”! Neste processo, um dia, a minha prima pede para me ligarem urgente e diz que me quer falar. Conhecendo o meu percurso de fé, pergunta-me apenas: «Que sentido tem a minha vida? Que sentido pode ter a vida nesta cama de hospital?» E depois diz-me (ou melhor escreve!): «pedi para falar com um padre», ela que estava tão afastada da Igreja! Com simplicidade lhe contei o que tem sido para mim a experiência da vida na Companhia de Jesus, que não me desilude, que me liberta das circunstâncias e que me aponta um sentido da vida, muito para além do meu limite. Disse-lhe também que, para mim, a profundidade da nossa amizade estava a ser muito maior naquela cama de hospital e naquela circunstância dolorosa do que havia sido em tantos momentos aparentemente fáceis, mas também cheios de futilidade e vazio. Continuei a rezar por ela. Este mês, recebo uma mensagem da minha prima, com muita alegria, a contar que se tinha confessado!

Neste e em tantos exemplos, apesar e através do meu limite, do meu pecado, vou dando pequeníssimos passos que me permitem fazer experiência da profundidade, significado e eternidade da vida, percebendo que existo para O encontrar.

Isabel, Lisboa