O Meeting é mesmo um encontro

«Eu não quero saber se tu, que estás aqui à minha frente, és Cristão ou Muçulmano. Eu quero saber, antes de tudo, que tu és um homem. Que tu és alguém que está aqui pela mesma razão que Deus me pôs a mim aqui, e isso faz de ti meu irmão»

Quando o grupo de treze voluntários portugueses chegou ao Meeting de Rimini, a primeira reacção foi comum: o espanto pela grandeza de tudo o que nos rodeava. O espaço da feira tem o tamanho de qualquer coisa como dezasseis campos de futebol e os voluntários eram aos milhares, de todas as idades e de várias partes do mundo. Trabalhámos todos os dias das 10:15 às 23:00. Um horário exaustivo, que ao fim de uns dias começa a pesar, mas nada que roubasse a nenhum de nós a alegria de estar ali, de fazer parte de um encontro tão grande. Em todo o tempo livre que tínhamos pudemos confirmar este título, entre conferências ou exposições. Houve uma exposição em particular em que percebi verdadeiramente porque é que se chama Meeting pela amizade entre os povos, porque tive um encontro algo inesperado. A exposição chamava-se “EGIPTO. Quando os valores tiram a vida”. Quem me guiou nesta exposição foi um rapaz dois anos mais novo que eu, era Egípcio e Muçulmano. A exposição tinha como foco demonstrar que, ao contrário do que os media querem dar a entender hoje em dia, não tem que haver uma divisão entre Cristãos e Muçulmanos. Falava sobre a convivência entre Ortodoxos e Muçulmanos no Egipto, antes e durante a “Primavera Árabe”. Por exemplo, aprendi que numa região do Egipto, havia um dia do Ramadão em que os Cristãos se juntavam aos Muçulmanos e jejuavam juntos. Neste dia do ano, quando o Sol se punha, as mesquitas, em conjunto com os sinos das igrejas, davam sinal a todos de que o jejum daquele dia tinha acabado. Encontramos outro exemplo de aproximação entre estes dois povos noutra região do Egipto, onde todos os anos Cristãos e Muçulmanos faziam uma procissão em honra de Nossa Senhora. Certo ano, o ditador Mubarak proibiu os muçulmanos de festejarem este dia em conjunto com os Cristãos. Perante isto os Cristãos locais responderam que não fariam a festa sem os seus amigos Muçulmanos. Uma exposição riquíssima que demonstrou que existe mais a aproximar estes dois povos do que aquilo que os afasta. Espantado não só com a exposição mas também com o rapaz que a guiou, pedi-lhe para falar com ele mal terminou a sua explicação. Respondeu prontamente que sim. Um bocado a medo certifiquei-me com ele do pouco que sabia da religião Muçulmana. Pedi que tivesse paciência para algum disparate da minha parte, pois nunca havia falado com um Muçulmano, e, sobretudo, queria aprender um pouco mais. Comecei por confirmar aquilo que achava que já sabia relativamente ao modo como os Muçulmanos interpretam a vontade de Deus. Para eles a vontade de Deus deve ser imposta, não é tanto como nos ensina o Cristianismo em que há espaço para a liberdade do homem em ser guiado por essa vontade. A certa altura perguntei-lhe o que distinguia os primeiros muçulmanos do século VI, conduzidos por Maomé, dos actuais Muçulmanos extremistas. Tinha esta questão dada a enorme conquista de território por parte daquele povo nos seus primeiros anos de existência e que, certamente, não teria sido pacífica, tal como os guerrilheiros Muçulmanos da actualidade. Isto fazia-me confusão pois ambos agiam/agem em nome da vontade de Deus. Respondeu-me que, apesar dos métodos bélicos utilizados naquela época, a religião do Islão não era uma imposição. Havia convivência entre os povos conquistados e o povo muçulmano, e foi exactamente nessa convivência que, no geral, a conversão dos conquistados se deu. O único motivo daquele povo era espalhar aquilo em que acreditavam, espalhar a mensagem de que havia mais um profeta depois de Jesus. Pelo contrário, “os actuais muçulmanos extremistas são guiados, não pela vontade de Deus, mas pela vontade dos homens”, nas palavras dele. Não respeitam a liberdade religiosa e por isso fecham-se em si mesmos, fecham-se à existência do mundo fora do Islão. Disse-me que estes extremistas têm medo do Cristianismo porque o vêem como uma afronta à sua ideologia, e, por isso, odeiam os Cristãos. Perante esta resposta surgiu-me mais uma pergunta. Devo dizer que a resposta que ele me deu me deixou em completo silêncio. Perguntei-lhe então qual era a diferença entre um muçulmano normal como ele e um muçulmano extremista no olhar para um Cristão. Ao que ele me respondeu: «Eu não quero saber para nada se tu, que estás aqui à minha frente, és Cristão ou Muçulmano. Eu quero saber, antes de tudo, que tu és um homem. Que tu és alguém que está aqui pela mesma razão que Deus me pôs a mim aqui, e isso faz de ti meu irmão. Antes de tudo és meu irmão, depois disso vem a tua cultura ou a tua escolha religiosa mas nada disso é suficientemente grande para eliminar o facto de seres meu irmão, e por isso quero-te.» Depois de um longo silêncio da minha parte, em que fiquei sem palavras, só lhe pude agradecer por me ter ajudado a crescer mais um bocadinho naquela conversa. É impressionante que eu, com esta última pergunta, estava exactamente a agir como os media ou como os grupos terroristas. Eu próprio, com esta pergunta, estava a delimitar uma diferença entre nós. O teor da pergunta já admitia que ele tinha que olhar para mim de uma certa maneira condicionado apenas pelo facto de eu ser Cristão, esquecendo toda a vastidão que constitui o meu ser, a minha essência e a minha origem. Este encontro que tive foi uma prova de que o Meeting, tal como o nome indica, é mesmo um encontro. Só assim, com este horizonte de verdade, de encontro e de amizade, se torna possível fazer algo desta dimensão. Meeting pela amizade entre os povos. Posso dizer que fiz mesmo a experiência deste nome, pois tive um encontro que nunca mais vou esquecer com alguém de um outro povo, e isto marcou a minha semana.
Martim