Encontro «Que quer dizer esta solidão imensa? E eu, o que sou?» (Foto: Pedro Marques Pereira)

Meeting Lisboa 2024. A «solidão imensa» e «aquilo que nunca morre»

Os encontros da tarde de sábado e as exposições da 9.ª edição do Meeting Lisboa. A «solidão imensa» de Leopardi, aprofundada por padre Mauro Giuseppe Lepori, e «aquilo que nunca morre»
Hugo Dantas

Na tarde de sábado do Meeting de Lisboa 2024, dominou a história de Takashi Nagai. Como ocorre tantas vezes, a fé de Takashi começou com uma longa viagem: do materialismo à verdade do espírito; do ateísmo à fé. Por isso se pode dizer que a sua história é também a história de outra longa viagem: a que levou os portugueses ao Japão, em 1543, a que trouxe S. Francisco Xavier a aportar às praias de Nagasáqui e semear naquelas ilhas remotas as primeiras sementes do Evangelho.

No encontro das 15h, com o título «Takashi e Midori Nagai: o caminho rumo àquilo que nunca morre», a professora Ana Fernandes Pinto recordou como esta semente frutificou extraordinariamente, antes que sobre a comunidade cristã caísse a violência de um Estado unificado em formação, que não podia consentir a divergência no seu seio. Contudo, é a herança destes cristãos, perpetuada clandestinamente através dos séculos, que Takashi vem a encontrar na família Moriyama, em cuja casa se hospeda, na região de Urakami. Como narrou Paola Marenco, curadora da exposição sobre a sua vida, sendo Takashi um homem de razão, procurou ver que religião escondida era essa que prometia a vida eterna, depois de ter vislumbrado no olhar da mãe moribunda «algo que não podia morrer». E, conquanto a fé não seja nunca o produto de uma verificação, ao estilo de uma prova científica, é a razão que, muitas vezes, lhe limpa o caminho e lhe endireita as veredas. A leitura de Pascal e a experiência de viver com a família Moriyama conduziram Takashi ao limiar da fé, a que, por fim, franqueou a mente e o coração: baptizou-se em 1934 e desposou Midori.

Encontro «Takashi e Midori Nagai: o caminho rumo àquilo que nunca morre» (Foto: Pedro Marques Pereira)

Takashi e Midori seriam apanhados na tempestade da história: estavam presentes em Nagasáqui no dia 9 de agosto de 1945, quando a cidade foi devastada por uma das duas bombas atómicas detonadas no Japão. Takashi sobrevive; mas perde Midori, a casa e o trabalho da sua vida empregada na investigação médica. Ante a desolação das ruínas, colapsa ao peso da dor; quando acorda, põe-se a rezar, em angústia – mas ouve a voz do Evangelho que diz: «o céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão». Na solidão imensa da cidade destruída, Takashi não estava sozinho.

 Paola Marenco, curadora da exposição «Takashi e Midori Nagai: o caminho rumo àquilo que nunca morre» (Foto: Pedro Marques Pereira)

No encontro das 18h, o padre Mauro Giuseppe Lepori, abade geral da Ordem Cisterciense, falou desta solidão imensa – partindo do título deste Meeting – como ferida tantas vezes esquecida ou que se tenta esquecer no espectáculo incessante do nosso mundo. É esta ferida esquecida que, por exemplo, a boa arte recorda. A arte não é a cura da nossa solidão radical – no seu melhor, manifesta-a mais claramente, como esse verso de Leopardi que é o mote do encontro. Na verdade, a solidão sempre ameaça a existência, e a sua sombra sempre cerca o coração do homem, se não houver uma presença que nunca morre, uma companhia que nunca deserta. Porque «não é bom que o homem esteja só», como o pastor errante do poema de Leopardi, cujo coração é devorado pela vastidão das estepes e da noite da Ásia: o homem só se realiza na comunhão; e o seu coração só se aquieta no conforto de uma companhia que por nada se abala: aquela que só a Deus pertence dar. A Igreja, enquanto corpo de Cristo, é a antecâmara dessa comunhão indestrutível.

Padre Mauro Giuseppe Lepori (Foto: Pedro Marques Pereira)

Paralelamente aos encontros, esteve aberto um salão com três exposições. Além de uma sobre Takashi, ricamente ilustrada com documentos fotográficos, os visitantes puderam encontrar outra sobre sete heróis contemporâneos na defesa da vida e a exposição sobre Carlo Acutis – que, se soube há escassos dias, será em breve canonizado. Também ao percorrer esses painéis, não obstante a brevidade da sua vida terrena, tem-se a impressão de que Carlo nunca caminhou sozinho, e sempre intuiu a vida que não passa e a presença que não foge. O sentido desta presença manifesta-se, particularmente, na sua devoção a Jesus no sacrário, e como, usando dos seus notáveis talentos informáticos, procurou divulgar os numerosos milagres eucarísticos em que essa companhia permanente e sempre próxima se mostrou no curso dos séculos, e em tantos pontos da terra, como que para lembrar que Ele nunca está longe daqueles que o procuram.

Exposição «Takashi e Midori Nagai: o caminho rumo àquilo que nunca morre» (Foto: Pedro Marques Pereira)
Exposição «Carlo Acutis: da informática ao paraíso» (Foto: Pedro Marques Pereira