O processo que não tem fim
Paolo Tosoni, advogado penal, narra a relação com os seus clientes. O desejo de conhecer não só os dados técnicos, mas quem tem diante de si: um envolvimento que permite ver “mais” a estrada a percorrer. E servir a justiça. Afirmando a grandeza do homem.«Obrigado por ter vindo, advogado. Venha, é ali, na cozinha». Sentado ao lado do frigorífico, um homem chora: é dele que toda a polícia da zona está à procura há alguns dias. Depois de ter cumprido a pena por ter violado algumas meninas, durante três anos o seu comportamento fora normal. Mas de repente reincidira, cometera novamente o crime. Paolo Tosoni, 56 anos, advogado penal, sócio de um dos escritórios mais importantes de Milão, aproxima-se e diz-lhe: «Olha para mim, eu constituo-me teu assistente sob três condições: entregas-te, contas tudo e fazes-te curar. Eu não te largo. Agora chamamos a Procuradoria. O homem aceita. Ao telefone o substituto adjunto diz: «Advogado Tosoni, fico contente que o tenha tomado a seu cargo. Espero-vos».
Normalmente, Tosoni acompanha casos de “colarinho branco”, isto é crimes que dizem respeito ao mundo societário, financeiro, um quadro penal de elite em suma. Além disso defender um pedófilo em série causa escândalo e pode arruinar a imagem no meio em que se move. Então, porquê aceitar? «Se me tivesse retirado teria sido qualquer coisa que me diminuiria, teria negado aquilo que descobri no encontro com o cristianismo e que determinou também a minha vida profissional nestes trinta anos, tornando-a entusiasmante: a pessoa é criatura de Deus, feita à sua imagem. O erro não é nunca a última palavra sobre a vida de um homem. Isto vale sempre. A frase de Santo Agostinho, “Condena-se o pecado, não o pecador” quer dizer uma paixão pelo homem que me faz afrontar o meu trabalho com o desejo de conhecer quem tenho diante mim para servir a nossa, embora falível, justiça, na consciência de uma Justiça que dirá respeito a todos».
É um outro modo de conhecer, que vai para além dos códigos e dos esquemas. É dali que nasce o «não te largo» dito naquele dia. « Por isso, naquele caso Tosoni chama como consultor um psiquiatra que começa a realizar sessões de acompanhamento com o seu cliente. Toma contacto com Paolo Giulini, perito à frente da equipa de criminólogos que se ocupam de sex offender na prisão de Bollate em Milão. E todas as semanas vai à prisão. No fim da discussão do processo de apelo, diz a três juízas: «Esta é uma pessoa doente, se não fizer um percurso terapêutico sério quando sair da prisão reincidirá. A cura é de conveniência civil. Se também vós derdes um sinal de que a justiça crê na sua possibilidade de recuperação, isso será de uma grande ajuda». A sentença é de oito anos, face aos dez em primeira instância.
Para os crimes de “colarinho branco” com que tem de lidar, Tosoni, a maioria das vezes, deve conter os danos para o seu cliente. Recentemente defendeu um empresário acusado de corrupção. Tinha pagado a alguns médicos-chefes para poder vender os seus produtos nos hospitais. O crime é manifesto. Tosoni vai à prisão para se encontrar com ele. Conhece a sua história empresarial e o percurso que teve de fazer para poder crescer como empresa. «Descobri a partir do interior como funciona o sistema de saúde e, como frequentemente acontece no nosso País, a burocracia mata favorecendo a corrupção». Durante o seu diálogo, o empresário fala-lhe de si: dinheiro, bela vida, a amante. E depois de repente por causa daquela incriminação perde tudo. «Não faz parte do meu trabalho. Podia limitar-me aos dados técnicos, sem querer saber mais. Mas teria sido ainda um "menos" também profissionalmente. Na relação com ele, “perdendo” tempo a falar, emergiram tantos detalhes da sua história, da sua vida, que foram fundamentais para a sua mudança. Na prisão reconheceu os seus erros, e voltou a começar de novo, chegando a pedir à mulher para poder recomeçar a vida familiar deles». No processo chega-se ao acordo judicial. Por conseguinte, os danos foram limitados? «Sim. Mas foi dada a prova de que acompanhar, “perder” tempo, em suma afeiçoar-se são fatores que criam as condições para que uma pessoa possa dar-se conta dos erros e recomeçar. E para que aqueles ao redor dele possam compreender melhor a situação, ter mais elementos para conhecer e ajuizar. Esta é a satisfação maior».
Isto é válido para todos aqueles que trabalham no âmbito da Justiça? «Falando em sentido laico, significa afirmar a grandeza do homem, que não é definido só pelos seus atos. Eu aprendi-o no início da minha carreira quando trabalhava no escritório de Nerio Diodà, homem de esquerda, mas que tinha bem claro este conceito. Transmitiu-mo e eu fi-lo meu dentro da minha história. Para nos entenderem, defendíamos os investigados de Tangentopoli. Na relação com os juízes e o ministério público, digo que, estabelecida a verdade dos factos, fornecendo eles dados que não estão nos autos, há sempre a possibilidade de mudança. Insisto em repeti-lo para que se torne cultura judiciária e não um simples pensamento meu. Porque aquilo que acontece nas salas de audiência de um tribunal a vários níveis produz cultura. Pode até dar um contributo às instituições». Fora e dentro das salas de audiência. Às vezes também longe do tempo processual. Como aconteceu com o juiz Elvio Fassone que por mais de trinta anos manteve uma troca epistolar com Salvatore, o homem que tinha condenado ao cárcere no maxi-processo da mafia. Aquelas cartas tornaram-se um livro que Tosoni lê de um fôlego. Permanece de tal modo impressionado pelo livro a ponto de convidar o juiz a participar do Meeting de Rimini de há dois anos. «Naquelas páginas para mim narra-se o que significa conhecer afetivamente. O que é que isso pode gerar. Na relação com Salvatore, Fassone conheceu de perto o cárcere. Começou a ajuizar e a ter por negativo aquele estabelecimento, o cárcere, ao qual o tinha condenado. Não só; chegou a formular algumas propostas legislativas quer para o ordenamento penitenciário quer para o código penal, para mitigar a prisão perpétua. Conhecê-lo e a sua história para mim foi a confirmação daquilo que me moveu e me move na vida profissional. Decerto, por vezes trabalhar com esta tensão não te deixa dormir à noite, às vezes deves ter a lucidez de te afastar para compreender, para que toda a verdade possa emergir. Às vezes erras. Mas assim não se cede ao cinismo. E talvez também por isso fiquei sempre ligado aos meus clientes».
Talvez por esta razão vá periodicamente ao encontro do violador em série. Mesmo que o processo já tenha terminado.