um momento do encontro

Quando a Misericórdia aparece

Uma apresentação viva de obras de "misericórdia" em Portugal e Itália.
Margarida Pacheco de Amorim

No Sábado dia 18 de janeiro, teve lugar no Colégio de São Tomás um encontro promovido pela Companhia das Obras, onde fomos conhecer melhor duas obras de Misericórdia, com mais de 500 anos de história - a Hospedaria dos Inocentes em Florença, apresentada por Mariella Carlotti, e a Santa Casa a Misericórdia, contada por Margarida Montenegro.

A Mariella Carlotti explicou que a Hospedaria dos Inocentes é um espantoso edifício projetado por um dos arquitetos italianos de maior relevo do séc. XV, Filippo Brunelleschi, e que reflete, já na sua arquitetura de nove janelas, o que pretende ser: o abraço da Santíssima Trindade a crianças recém-nascidas que, por diferentes razões, eram deixadas ao cuidado da Hospedaria. As crianças eram entregues através de uma janela de grades e recebidas num presépio onde durante algum tempo ocupavam o lugar de Jesus, numa manjedoura entre Maria e José. Traziam consigo um "sinal", normalmente metade de uma medalha; a outra metade ficava com a mãe ou com os pais que, se anos mais tarde quisessem procurar o filho, a apresentavam para se identificarem. Na Hospedaria registava-se todos os acontecimentos relevantes da vida de cada um dos Inocentes. Era na Hospedaria que as crianças aprendiam um ofício e onde podiam sempre voltar caso precisassem porque a Hospedaria era a sua família. Mariella Carlotti terminou aludindo às palavras do Papa Francisco, na sua visita à Hospedaria dos Inocentes, no ano passado: «As vítimas das guerras, as vítimas das migrações, as crianças não acompanhadas, as vítimas da fome. Crianças com metade da medalha. E quem tem a outra metade? A Mãe Igreja. Nós temos a outra metade. É preciso refletir e fazer perceber às pessoas que nós somos responsáveis por esta outra metade e ajudar a fazer hoje outra casa dos Inocentes, mais mundial, com atitude de adoção».

Margarida Montenegro introduziu-nos à historia paralela da Santa Casa da Misericórdia, uma obra mais conhecida nossa, cujo nascimento se ficou a dever à rainha D. Leonor e que ao longo de cinco séculos tem apoiado muitos pobres e desalojados, em Portugal e nos países onde Portugal teve presença. Recebia, também, crianças abandonadas na roda, os”expostos", em várias zonas do país; em Lisboa eram acolhidos no Hospital de Todos os Santos. As crianças eram entregues na roda e traziam um bilhete com o seu nome, com a indicação da data de nascimento e do dia do batismo e com um "sinal", metade de um artigo, de um bilhete, ou de uma medalha, ficando os pais com a outra metade, o "contra-sinal". Vimos três desses bilhetes e sinais, incluindo um sinal com contra-sinal entregue, identificando o reencontro feliz, e que se encontram cuidadosamente guardados nos registos da Santa Casa.

Foi um encontro vivíssimo, cheio de beleza, não só pelo quanto as obras falam por si e do amor concreto e gratuito a milhares de Inocentes e aos seus pais, mas também pela forma como foram apresentadas, com muito orgulho e estima.