Uma aldeia para os jovens

O maior desejo? “Ter um coração que rebente. E quando isso acontece ...”. O responsável pela obra o Imprevisto, cooperativa para menores em risco, falou de educação em frente do recém presidente do Parlamento Europeu
Silvio Cattarina

Há muitos anos que trabalho com os jovens, vivo com eles, sobretudo com miúdos difíceis, com vidas complicadas. Com muitos outros amigos conduzimos a experiência das comunidades terapêuticas do Imprevisto em Pesaro. Reparei sempre que os meus miúdos, no fundo, mostram aquilo que são todos os miúdos de hoje. Quando penso neles, os meus pensamentos acabam por ir até ao mar de Lampedusa, onde vemos morrer tanta gente que vem de longe, que chega vinda de uma grande dor.

Então penso nos nossos miúdos, nos nossos filhos, em todos os jovens. Também eles chegam vindos de longe e da grande dor do mundo. Vindos do mar obscuro e obtuso da inconsistência e da perda, do mar atrofiado da nossa sonolenta habituação ao poucochinho, ao costume, ao nada. Da melancolia que paraliza, que sufoca. Que fizemos com a exorbitante promessa de vida, de alegria, de coragem, com que qualquer ser vem ao mundo? Que fizemos com a expectativa de bem, de eternidade, que mora no coração de cada jovem? Para onde guiámos esta comovente promessa? Nestes tempos melancólicos e pesados, os jovens oferecem-se para um sacrifício quase planetário de desmesurada dimensão. Como os refugiados de Lampedusa, também os nossos miúdos se imolam pelo mundo, pelo mundo inteiro, albergando nos seus dias as dores de todos. Pode-se dizer que neste momento os jovens representam o maior e mais dramático campo de refugiados de todo o Ocidente.

Mas é preciso saber que estes miúdos se sacrificam por uma coisa grande, a sua vida chama, aliás, é chamada a coisas grandes. Isto é justiça: se sobre esta terra existe beleza para mim e para a minha vida. “Para que nasci? Há um lugar, mesmo, para mim? Que destino terá a minha vida?” (...) É o coração do homem que conta, a sua alma. Contam os infinitos pedidos de sentido que gritam dentro do coração dos miúdos, a desmesurada necessidade de vida que explode cada vez mais no seu peito. São precisos adultos, pais, professores, padres, com um coração grande, capazes de acolher, abertos à misericórdia. Em suma, é preciso a educação, uma grande, nova e forte obra educativa, uma renovada capacidade educativa de todo o povo, da sociedade inteira.
Senão, os jovens continuam a pensar que é o mais forte quem tem razão. E assentam a vida nesta lógica, pensam que a vida é uma questão de poder, de sucesso. Que no fim o verdadeiro vencedor será o mal, que não é possível mudar, ajudar-nos, querer-nos bem. É um novo e mais sério paganismo.

Não, é preciso a comunidade, uma aldeia, disse o Papa Francisco: é preciso a educação. A resposta ao mistério do sofrimento, à desorientação e perda de sentido, a resposta ao vazio existencial de que tanto se fala, não é uma explicação, um discurso, mas uma presença, estar, interessarmo-nos pela dor que há no mundo, sobretudo a dor dos jovens. (...)É importante que o jovem sinta que a sua vida é preciosa para os outros, para quem está próximo dele. Que sinta que tudo à volta dele diz “tu existes, tu és importante para mim, tu tens valor, tu contas, tu tens uma grande tarefa, uma responsabilidade”. É um espetáculo ver um jovem renascido: por uma pessoa assim mudada o mundo será posto do avesso, encaminhado para a sua verdade.

Tudo está no valor da pessoa, não naquilo que somos ou que temos. O valor está em qualquer coisa que não está em nós; está no nosso íntimo, mas não é nosso, não nasce dentro de nós, vem antes de nós. É uma verdadeira revolução. Os jovens desejam ver, encontrar uma experiência radical, fascinante, uma proposta que tenha dentro alguma coisa irredutível, imprevista, subversiva. (...) O homem procura continuamente em cada coisa, em qualquer ação, não uma técnica, mas uma medida diferente, invoca uma medida nova, um coração novo. Este é o maior desejo do homem: que o coração rebente, expluda. Este é o milagre.

Termino com uma frase que disse há tempos um dos meus rapazes: “Eu descobri qual é a coisa que me faz sofrer mais: é ter uma namorada de quem tu gostas tanto e não sabes dizer-lho”. Como esta frase me tinha comovido, quis explicar melhor o conceito, e acrescentou: “Não sabes dizer-lhe porque é que gostas tanto dela”. Eu penso que um rapaz que não sabe exprimir quanto de grande tem no coração, quanto de grande e de infinito existe no céu e na terra, é um pobre rapaz.