O quarto da Jacinta

O entusiasmo de crianças tipicamente irrequietas quando se lhes mostra que a experiência da santidade está ao seu alcance

A Maria, o Pedro e eu somos os catequistas de um dos grupos do Casalinho, uma dúzia de crianças com quem vivemos e convivemos desde pequeninos, há cinco ou seis anos. Este tem sido um ano particularmente significativo para nós, pois começámo-lo com um grande desejo de ir à procura das coisas belas, ao encontro de quem nos pudesse receber e ajudar a ver a Beleza! O último sábado foi um dia em que nos lançámos mais uma vez nesta aventura.
Partimos para o Jardim das Necessidades, onde jogámos e fizemos um pique-nique. Já ao almoço, expliquei a importância do local que mais tarde visitaríamos: o quarto onde Jacinta, já doente, ficou durante uns tempos em Lisboa e onde Nossa Senhora lhe apareceu. Todos estávamos entusiasmados; íamos poder tocar na cadeirinha onde Nossa Senhora se sentou a fazer companhia à Jacinta!
Depois de uma manhã bem passada e de várias viagens num carro de cinco onde encaixamos 16 pessoas, chegámos ao quartinho. Lá, fomos recebidos pela irmã Rita, uma irmã nova e que a todos chamou à atenção pela alegria e pelo sorriso tinha. A irmã Rita quis saber o nome de cada um e perguntou-nos qual era a coisa que mais gostavamos de fazer. A irmã Rita estava mesmo interessada em nós.
Antes de irmos ao quarto, conversámos com a irmã Rita para que nos contasse a história daquele quarto e de quem por lá passara. Depois de um primeiro momento em que as crianças muito curiosas fizeram perguntas bastante engraçadas como – “As irmãs que vivem aqui são do mesmo pai e da mesma mãe?” ou “As irmãs não podem sair, nem mesmo quando têm fome?”, todos fizeram silêncio para ouvir a irmã Rita.
Da conversa lembro-me de todas as palavras, da dor que a Jacinta sentia mas oferecia a Jesus, da vontade de ir para o céu, da certeza de que Nossa Senhora a acompanhava... Mas lembro-me sobretudo do olhar das crianças, olhavam para a irmã Rita com os olhos esbugalhados, ansiosos por ouvir e participar naquilo que contava, a querer responder às questões que fazia e cheios de perguntas daquelas que vêm mesmo do coração. Estavam fascinados e eu também, ciente da graça que nos estava a ser concedida.
Quando entrámos no quartinho, ajoelhámo-nos diante da cama da Jacinta e da imagem de Nossa Senhora e, em silêncio, cada um pôde pedir as suas intenções antes de rezarmos uma Avé Maria. Aqui, tivemos a certeza de que Nossa Senhora nos ouvia. A irmã Rita propôs que olhássemos com atenção para o quarto e dissessemos o que víamos. Vimos um quarto simples, com pouca coisa mas donde emanava, através dessa simplicidade e das imagens nas paredes, um enorme amor a Nossa Senhora e a Jesus.
Fomos então ao sítio onde a Jacinta passava mais tempo: uma janela que dava para o sacrário pois estava demasiado fraca para descer à capela. A visão de uma rapariga da idade deles que, estando no fim da vida, fraca e cheia de dores, se esquecia de si própria e passava horas a rezar, deu um impulso às nossas crianças que quiseram também ajoelhar-se na janela e ver aquilo que Jacinta via.
Sendo esta já um imagem bastante comovente - as nossas crianças irrequietas, habituadas a estar no bairro a fazer as asneiras ali a contemplar - espantei-me mais ainda quando vi que depois daquele bocadinho de joelhos, algumas crianças saiam a chorar, comovidas e todas muito contentes.
Já no fim da visita, a irmã Rita contou mais algumas histórias da Jacinta, sendo uma delas sobre Jesus escondido na hóstia, a quem gostava muito de fazer companhia. Talvez por isso, quando a irmã Rita se despediu e perguntou se alguém queria ir um bocadinho à capela onde o Santíssimo estava exposto, todos quiseram e, quando me juntei, estavam muitas crianças a olhar para a hóstia consagrada com um olhar diferente, cheio de novidade, nem queriam ir embora! Quase todos me pediram se poderíamos voltar no sábado seguinte.
Para acabar bem o dia, fomos ao jardim da Estrela onde a Catas veio ter connosco para nos ajudar num filme que estamos a fazer na catequese. A Catas ajudou-nos a perceber a importância daquilo que estamos a fazer e a perceber porque o fazemos. Sentámo-nos numa roda e fizemos alguns jogos em que treinámos a memória, a imaginaçao e a dicção. Todos estávamos contentes!
Quando voltamos ao bairro fomos à missa e, olhando para as crianças, vi de novo aquele entusiasmo com que olhavam para a hóstia consagrada... Foi um dia incrível.
Francisca, Lisboa