Livro «Aquilo que nunca morre - O caminho de um homem», de Takashi Paulo Nagai (Ed. Paulus)

Livro do mês. «Aquilo que nunca morre - O caminho de um homem»

O livro do mês de dezembro de 2024 proposto pelo CL em Portugal, é o livro «Aquilo que nunca morre - O caminho de um homem», de Takashi Nagai, recentemente publicado, em português, pela Editora Paulus. Um leitor partilha a sua experiência

É uma biografia; não costumo ler biografias, nem romances. Com a idade, terminaram tarefas, iniciaram-se outras. Agora, o tempo, sempre o tempo, é utilizado de forma diferente. Menos disciplina horária, mais tempo para ler por escolha minha, livros acumulados em espera. Chegaram mais quatro à pilha, ficam com prioridade, li dois, vou para o terceiro, o terceiro é: «Aquilo que nunca morre», de Takashi Paulo Nagai, e é uma biografia.

Então, porquê ler esta autobiografia? Os dois livros que referi ter lido, dos quatro chegados à “pilha”, são: «S. Francisco de Assis», de G. H. Chesterton, e «Querido Amigo», sobre a vida de Enzo Piccinini. São vidas de Santos. Impressionam, fazem-nos pensar e refletir, se é possível ser-se assim; espicaçam-me a ler o seguinte, ou seja, «Aquilo que nunca morre», de Takashi Paulo Nagai.

O Prefácio é do Pe. Mauro Giuseppe Lepori. Lê-se num sorvedouro. Fascina, é síntese e vertigem, apega num instante. E agora, o que vem aí? Vem a Introdução de Gabriele Di Comite. Ele situa-me no tempo e no espaço: o Japão da primeira metade do século XX. Transporta-me para a cultura do autor e do seu país, rapidamente, para a vida dos católicos japoneses desde o século XVI ao tempo da narrativa, sem o que não seria possível, durante a leitura, encarnar cada uma das pessoas e entender a forma como eles sentiram os acontecimentos.
Depois a realidade: a vida de Takashi e da sua esposa Midori Marina Moriyama, sem rodriguinhos, nem adjetivação supérflua. Apenas realidade. Dura, nua, crua, verdadeira.

A história de um homem e das pessoas da sua vida – esposa, filhos, colegas, e amigos –, do que o rodeou, dos valores e da missão que aceitou e para que foi eleito, por Quem o escolheu.

Nas guerras que participou pelo seu país, não permitiu que o seu coração estivesse como combatente, mas como médico, curando, indiferente à cor da farda que vestiam.
Na vida e no exercício da sua profissão, o seu coração foi o de um combatente, pela ciência e pelos outros, sobrepondo essa luta muitas vezes ao bem-estar familiar ou à sua própria vida, doando em cada momento a própria vida.

Takashi sabia o perigo associado à exposição diária aos raios X, conhecia a longa lista de mártires entre os pioneiros da nova ciência, mas não recuou, não vacilou e intensificou estudos, ensaios, e exames preventivos. Acaba por ser mais uma vítima daquela exposição continuada ao contrair leucemia; doou-se em vida.

Também a sua esposa Midori doou toda a sua vida ao marido e à sua família. O seu sacrifício só é compreensível se conhecermos a cultura oriental e japonesa, ou se estabelecermos um paralelismo com Maria de Nazaré.

Protegido pelas paredes de betão do seu laboratório, a vida de Takashi Nagai foi poupada aos efeitos causados pela bomba atómica lançada sobre Nagasaki no dia 9 de agosto de 1945. Tudo à sua volta era devastação, Deus queria-o vivo, o seu sofrimento não acabaria ainda.

No fim, as imagens transportam-me para a verdade. Elas dizem-me que não estive a ler um romance, não estive a ler ficção. Por mais que doa, por mais que queira relativizar, a verdade afirma-se, apenas a verdade.

Num instante, o livro está lido! Agora, ou continuo a encarnar a “personagem” Takashi Nagai sentindo as suas dores, com a aceitação da sua/minha cruz, ou saio fora da “personagem” regressando à “minha pele”, para prosseguir a minha vida.

Numa análise crítica ao tempo de Takashi, vejo que a mesma ciência utilizada pelo médico radiologista japonês para o bem, é utilizada por outros para o mal, para a destruição maciça. Hoje, a ciência também pode ser para a criação ou a destruição. O mal que permanece é a ausência de Deus.

António Fernandes