Estados Unidos e Democracia

A pergunta sobre o caminho que estamos a enveredar não diz apenas respeito aos EUA, é claro: as pessoas mais atentas já constataram que o tema da crise da democracia afecta todo o mundo ocidental...
Roberto Fontolan

Lentamente a campanha eleitoral americana está a aquecer. Entre primárias, convenções e sufrágio final vai durar um ano. E como os temas são enfadonhos (não se pode falar todos os dias de fisco, imigrantes e lobbies do armamento), o que conta é o candidato: o seu look, os esqueletos do seu armário e sobretudo o seu dinheiro. Um sujeito ou sujeita abre caminho porque capaz de atrair milhões de dólares. Quem o fizer melhor ganha, porque irá comprar mais espaços na tv ou dispor dum staff de topo nas redes sociais. Parece paradoxal a pátria da democracia estar tão interessada em contabilizar os dólares para avaliar uma estratégia política, mas é ler para crer.

E assim, enquanto os republicanos se interrogam se realmente poderão apresentar Donald Trump como competidor na arena de 2016 e os democratas se a pouco simpática Hillary conseguirá superar os escândalos (entretanto já recolheu 50 milhões de dólares), o New York Times empenha-se em longas e interessantes páginas sobre o futuro da democracia. A pergunta sobre o caminho que estamos a enveredar não diz apenas respeito aos EUA, é claro: as pessoas mais atentas já constataram que o tema da crise da democracia afecta todo o mundo ocidental, que esbraceja em busca de soluções perante os enredos da representatividade, da relação entre voto popular e interesses partidários, dos mecanismos de decisão, da influência da globalização tecno-económica nas instituições políticas e assim por diante. Um editorialista propõe um regresso à lição do pai dos constitucionalistas, John Adams, para quem «as paixões são iguais em todos os homens e, quando não controladas, produzem os mesmos efeitos da violência, fraude e crueldade»; donde a necessidade de «um governo de leis e não de homens». Porém o mesmo comentador acrescenta que o marxismo primeiro e o islamismo agora demonstram que «um sistema justo de governo não cria uma melhor geração de homens». Portanto, em que ficamos? Para um outro estudioso «o facto da democracia ocidental parecer estar sempre em crise poderá ser o segredo da sua força». Mas, dito isto, hoje o grande tema que se coloca é o da liberdade dos indivíduos «que explodiu graças à potência capilar das novas tecnologias e à difusão da filosofia dos direitos humanos». Onde se verifica isto? «Nos fluxos crescentes e imparáveis de pessoas (migrações), bens (economia global), informações (internet e redes sociais)».

Se estes fenómenos irão levar à destruição da democracia ou ao seu renascimento é precisamente objecto de reflexão (não se poderia fazer isto por cá também?) e análises contrapostas. Entretanto, as sondagens de opinião demonstram que os cidadãos eleitores exprimem uma tendencial desconfiança no processo que conduz ao governo democrático e começam a não enjeitar opções autoritárias. «A democracia é uma forma prodigiosa, cuja força não assenta na capacidade de responder a todos os desafios, mas na sua maleabilidade: desenvolver novas instituições modeladas por novas normas» escreve um estudioso numa página onde aparece um grande anúncio da Google: «Tecnologia como instrumento de Democracia».