AQUILO QUE VALE

Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua alma? Ou que poderá dar o homem em troca da sua alma?

Há um versículo do Evangelho que talvez devêssemos reler com mais frequência. Convém, porque a realidade às vezes aperta de tal maneira que quase parece derrubar-nos, enquanto naquelas linhas encontramos sempre um sólido ponto de retomada. E porque a proposta cristã, o contributo que a fé pode dar à história, no fundo passa em grande medida por ali, por aquelas palavras de Jesus: Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua alma? Ou que poderá dar o homem em troca da sua alma?».

É uma pergunta decisiva. Nada é mais importante do que a «própria alma», ou seja, do que a pessoa: poder, dinheiro, ideias, projectos… Nada. Para Cristo, o indivíduo – tu, eu – vale mais que qualquer outro bem. E vale quer dizer duas coisas. Nada tem mais valor, nada é mais precioso, do que esse tesouro infinito que é o homem. E nada é mais válido – ou seja forte, potente – do que um homem livre que diz “eu”, que tem verdadeiramente uma consciência adequada de si e da realidade. Porque é a consciência do eu o ponto em que – como escrevia Henri Daniel-Rops, muitas vezes citado por don Giussani – «se elabora o destino do mundo».

Não é por acaso que Deus aposta tudo nele. Desde sempre, desde Abraão em diante. Podia mudar o curso dos acontecimentos como quisesse, fazer e desfazer cada instante da história impondo-se a tudo e a todos, e no entanto propõe-Se à minha liberdade e à tua. Investe tudo no eu, porque sabe que daí pode vir tudo. Basta um homem disposto a dizer-Lhe «sim» e, através desse alento, Ele consegue chegar a todos. Pode oferecer à liberdade de todos o fascínio e a beleza que d’Ele nascem.

Assim como, num contexto mais dramático, é na pessoa que acontecem milagres de testemunho como os dos cristãos perseguidos do Médio Oriente; ou que nos surpreendem como no caso dum banqueiro que perdoa aos seus raptores depois de onze meses de cativeiro; ou, ainda, que nos impressionam como na figura de Oscar Romero, assassinado no altar enquanto celebrava missa e agora foi proclamado beato. E outros, ainda, como aqueles testemunhos bem mais próximos e pessoais de amigos portugueses, sobre o que Jesus vai fazendo entre nós.

São tudo histórias de pessoas que, dizendo «sim» a Cristo na medida das suas forças, vão mudando a porção de mundo que os rodeia. Tornam-no mais humano. E fazem-no grande.