EUROPA 2014 - É POSSÍVEL UM NOVO INÍCIO?

Apontamentos da intervenção de Julián Carrón no encontro de apresentação do documento de CL
Milão, 9 de Abril de 2014
Julián Carrón

1. O QUE ESTÁ EM JOGO
A Europa nasceu em torno de poucas mas grandes palavras como pessoa, trabalho, matéria, progresso e liberdade.
Estas palavras atingiram a sua plena e autêntica profundidade através do cristianismo, adquirindo um valor que antes não tinham, e isso determinou um profundo processo de “humanização” da Europa e da sua cultura. Basta pensar, para dar um exemplo, no conceito de pessoa. «Há dois mil anos o único homem que tinha todos os seus direitos humanos era o civis romanus. Mas por quem era constituído o civis romanus? Quem determinava o civis romanus era o poder. Um dos maiores juristas romanos, Gaio, distinguia três tipos de utensílios que o civis [romanus], ou seja, o homem dotado de todos os direitos, podia possuir: os utensílios que não se movem nem falam, os utensílios que se movem e não falam, ou seja, os animais, e os utensílios que se movem e falam, os escravos» (Cf. Gaio, Institutionum Commentarii quattuor, II, 12-17, citado em L. Giussani, O Sentido Religioso, Lisboa, Verbo, 2000, p. 126).
Mas hoje todas essas palavras se tornaram vazias ou vão perdendo cada vez mais a sua espessura original. Como assim?

Num processo longo e complexo, de que não estão isentos a mortificação de algumas dessas palavras – como liberdade e progresso – por obra da mesma cristandade que havia contribuído para originá-las, a um dado ponto da parábola europeia ganha peso a tentativa de tornar autónomas aquelas aquisições fundamentais da experiência que haviam permitido a sua plena emergência. Como escrevia há alguns anos o então cardeal Ratzinger, numa conferência em Subiaco, na sequência de um longo processo histórico, «na época do iluminismo […] na contraposição entre as confissões e na incumbente crise da imagem de Deus tentou-se manter os valores essenciais da moral fora das contradições, e encontrar para eles uma evidência que os tornasse independentes das múltiplas divisões e incertezas das várias filosofias e confissões. Pretendeu-se assim assegurar as bases da convivência e, mais geralmente, as bases da humanidade. Isso parecia possível nessa época, na medida em que as grandes convicções de fundo criadas pelo cristianismo em grande parte resistiam e pareciam inegáveis.» (J. Ratzinger in A Europa de Bento na Crise de Culturas, Lisboa, Alêtheia, 2005, p. 39). Assim se desenvolveu a tentativa iluminista de afirmar aquelas «grandes convicções», cuja evidência parecia poder-se sustentar por si mesma abdicando do cristianismo vivido.
Qual foi o resultado desta “pretensão”? As grandes convicções, sobre as quais se fundou a nossa convivência durante muitos séculos, resistiram à verificação da história? A sua evidência mantém-se perante as vicissitudes históricas com os seus imprevistos e provocações? A resposta está à vista de todos.
Prosseguia o Cardeal Ratzinger: «A busca de uma certeza tão reconfortante que pudesse permanecer incontestada para lá de todas as diferenças falhou. Nem o esforço, verdadeiramente grandioso, de Kant foi capaz de criar a necessária certeza partilhada. […] A tentativa, levada ao extremo, de modelar as coisas humanas prescindindo completamente de Deus conduz-nos cada vez mais para o abismo, à para o total esquecimento do homem.» (Ibid.)

Como se comprova este esquecimento? Bastaria dar-se conta do efeito que esse processo teve sobre dois dos factores para nós, europeus modernos, mais caros: a razão e a liberdade.
«Esta cultura iluminista – dizia ainda o Cardeal Ratzinger – define-se substancialmente pelos direitos de liberdade; parte da liberdade como um valor fundamental que tudo mede: a liberdade da escolha religiosa, que inclui a neutralidade religiosa do Estado; a liberdade de exprimir a própria opinião desde que não ponha em dúvida precisamente este cânone; o ordenamento democrático do Estado, ou seja, o controlo parlamentar dos organismos estatais […], a tutela dos direitos do homem e a proibição de discriminações. Neste caso o cânone está ainda em fase de formação visto que ainda há direitos do homem contrastantes, como seja o contraste entre o desejo de liberdade da mulher e o direito à vida do nascituro. O conceito de discriminação vai sendo cada vez mais alargado e, assim, a proibição de discriminar pode transformar-se sempre mais numa limitação da liberdade de opinião e da liberdade religiosa […]. O facto de a Igreja estar convencida [por exemplo] de que não tem o direito de conceder a ordenação sacerdotal às mulheres é visto por alguns, desde já, como algo inconciliável com o espírito da Constituição Europeia». Por conseguinte «uma ideologia confusa da liberdade conduz a um dogmatismo que cada vez se vai revelando hostil à liberdade. […] A separação radical da filosofia iluminista em relação às suas raízes torna-se, em última análise, um prescindir do homem.» Ora «esta filosofia não exprime a razão acabada do homem, mas apenas uma parte dela, e por via desta mutilação da razão não é de modo algum possível considerá-la racional.» Por isso, «a verdadeira contraposição que caracteriza o mundo actual não é entre culturas religiosas diferentes, mas entre a radical emancipação do homem em relação a Deus, às raízes da vida, por um lado, e as grandes culturas religiosas, por outro.» (Id., p. 26-27.33-34).
Isto não significa assumir uma posição preconceituosamente “anti-iluminista”: «O Iluminismo – escreve Ratzinger – é de origem cristã, e não foi por acaso que nasceu precisa e exclusivamente no âmbito da fé cristã» (Id., p. 37). Num memorável discurso em 2005, Bento XVI recorda o «“sim” fundamental à idade moderna» pronunciado por aquele, sem por outro lado subestimar as suas «tensões internas e também as contradições». Bento XVI sublinha assim a superação daquela situação de «recontro», na qual «aparentemente não havia mais nenhum âmbito em aberto para um entendimento positivo e frutuoso», entre a fé e a idade moderna, próprio da Igreja do século XIX (Bento XVI, Discurso à Cúria Romana, 22 de Dezembro de 2005).

Neste momento podemos entender melhor qual é o problema da Europa, a raiz da sua crise e o que está verdadeiramente em jogo. Deixamos ainda a palavra a Bento XVI:
«O problema da Europa de encontrar a sua identidade parece-me que consiste no facto de hoje termos na Europa duas almas:
- uma das almas é uma razão abstracta, anti-histórica, que tenciona dominar tudo porque se sente acima de todas as culturas. Uma razão que finalmente chegou a si mesma e tenciona emancipar-se de todas as tradições e valores culturais em prol de uma racionalidade abstracta. A primeira sentença de Estrasburgo sobre o Crucifixo era um exemplo desta razão abstracta que se quer emancipar de todas as tradições, da própria história. Mas assim não se pode viver. Além disso, também a “razão pura” é condicionada por uma determinada situação histórica, e só neste sentido pode existir.
- a outra alma é aquela a que podemos chamar cristã, que se abre a tudo quanto é razoável e que criou, ela mesma, a audácia da razão e a liberdade de uma razão crítica, mas permanece ancorada nas raízes que deram origem a esta Europa, que a construíram nos grandes valores, nas intuições grandiosas, na visão da fé cristã.» (Bento XVI, Entrevista Bells of Europe – Sinos Da Europa: Uma Viagem na Fé através da Europa, 15 de Outubro de 2012).
Ora, o que está hoje em risco é propriamente o homem, a sua razão, a sua liberdade, mesmo a liberdade de ter uma razão crítica.
«O perigo mais grave – dizia há uns anos don Giussani – nem é sequer a destruição dos povos, o homicídio, o assassínio, mas a tentativa, por parte do poder, de destruir o humano. E a essência do humano é a liberdade, ou seja, a relação com o infinito». Por isso, a batalha que deve ser combatida pelo homem que se sente homem é «a batalha entre a religiosidade autêntica e o poder» («A religiosidade autêntica e o poder», Tracce, Fevereiro de 2005, p. 27).
É esta a natureza da crise, que não é acima de tudo económica. Prende-se com os fundamentos. «Hoje, de facto, não é de per si evidente aquilo que é justo e pode tornar-se direito vigente relativamente às questões antropológicas fundamentais. À questão de saber como se pode reconhecer aquilo que verdadeiramente é justo e, deste modo, servir a justiça na legislação, nunca foi fácil encontrar resposta e hoje, na abundância dos nossos conhecimentos e das nossas capacidades, tal questão tornou-se ainda muito mais difícil.» (Bento XVI, Discurso ao Parlamento Federal no Reichstag de Berlim, 22 de Setembro de 2011). Sem a consciência de que aquilo que está em jogo é a evidência desses fundamentos, na falta dos quais não será possível uma convivência estável, distraímo-nos com a discussão sobre as consequências, esquecendo que estas têm origem noutro lugar, como vimos. Recuperar os fundamentos é a urgência maior que temos.

Responder a esta urgência não quer dizer voltar a um Estado confessional ou a uma Europa baseada em leis cristãs, como uma espécie de reedição do Sacro Império Romano, como se fosse essa a única possibilidade para defender a pessoa, a sua liberdade e a sua razão. Isso iria contra a própria natureza do cristianismo. «Como religião dos perseguidos, como religião universal, [o cristianismo] […] negou ao Estado o direito de considerar a religião uma parte da organização estatal, postulando assim a liberdade da fé. […] Quando o cristianismo, contra a sua natureza, infelizmente, se tornara tradição e religião do Estado […], foi e é mérito do iluminismo ter reproposto estes valores originais do cristianismo [todos os homens, sem distinção, são criaturas à imagem de Deus, têm todos a mesma dignidade] e ter devolvido à razão a sua própria voz» (A Europa de Bento..., op. cit., p. 37-38). Interessa pois não regressar a um momento já ultrapassado, mas enveredar por uma estrada na qual seja possível um verdadeiro diálogo sobre os fundamentos.
Nestas novas condições, por onde recomeçar?

2. O CORAÇÃO DO HOMEM NÃO SE RENDE
Apesar das tentativas ingentes de esquecer o homem, de reduzir a exigência da sua razão (reduzindo a amplitude da sua pergunta), a premência da sua liberdade (que não consegue deixar de se exprimir, em cada impulso, como desejo de realização), o coração do homem continua a palpitar, irredutível. Podemos surpreendê-lo nas mais variadas tentativas, eventualmente confusas, mas nem por isso menos dramáticas e de certo modo sinceras, que os europeus de hoje fazem para alcançar aquela plenitude que não podem evitar desejar e que se esconde, por vezes, sob roupagens contraditórias.
Um exemplo pode ajudar a compreender a natureza do problema, as reduções com que normalmente razão e liberdade são vividas. «Esta noite – escreve-me um amigo – fui jantar com dois colegas de liceu que são namorados e agora vivem juntos. A seguir ao jantar ficámos conversando longamente e surgiu a questão de ter ou não ter filhos. Este meu amigo diz-me: “Eu nunca vou trazer um filho ao mundo. Com que coragem condeno mais um desgraçado à infelicidade? Não assumo essa responsabilidade”. E depois acrescentou: “Tenho medo da minha liberdade: no melhor dos casos não serve para nada e, no pior, posso causar sofrimento a alguém. O que eu espero da vida é tentar fazer o menos mal possível”. Conversámos muito e falaram de uma data de medos com que vivem e de como sentem que não agora esperam mais nada da vida. E têm apenas vinte e seis anos.»
Por trás da recusa a terem filhos não está senão o medo da liberdade ou eventualmente o medo de perderem uma liberdade entendida de maneira redutora, daí o medo de renunciarem a si mesmos e aos seus espaços. Mas esse conjunto de medos que os bloqueia até que ponto irá determinar a sua vida? Falar das «grandes convicções» é falar dos fundamentos, isto é, do ponto de apoio que possibilita a experiência da liberdade, da libertação dos medos, e permite que a razão olhe para a realidade de tal modo que não nos sufoque.
O episódio relatado mostra que «a desorientação relativamente aos “fundamentos do viver”» não cancela as perguntas. Antes as torna mais dilacerantes, como diz o cardeal Scola: «O que vem a ser a diferença sexual, o que vem a ser o amor, o que quer dizer procriar e educar, por que se deve trabalhar, porque é que uma sociedade civil plural pode ser mais rica que uma sociedade monolítica, como nos poderemos encontrar uns com os outros para edificar uma comunhão efectiva em todas as comunidades cristãs e uma vida boa na sociedade civil; como renovar a finança e a economia, como olhar para as fragilidades, da doença à morte, à fragilidade moral, como buscar a justiça, como partilhar incessantemente aprendendo a necessidade dos pobres? Tudo isto tem de ser revisto nos nossos tempos, repensado e portanto revivido». (A. Scola, Palavras pronunciadas após a Homilia do IX Aniversário da morte de don Giussani e XXXII do reconhecimento pontifício da Fraternidade de CL, Milão, 11 de Fevereiro de 2014).
Revisto, repensado e portanto revivido.
Esta é a natureza da provocação que nos lança a crise em que estamos mergulhados.
«Uma crise – dizia Hanna Arendt – obriga-nos a voltar às perguntas; exige de nós respostas novas ou velhas, desde que procedam de um exame directo; e apenas se transforma numa catástrofe quando tentamos fazer-lhe frente com juízos preconcebidos [de qualquer tipo], ou seja, preconceitos, agravando-a e ainda por cima renunciando a viver essa experiência da realidade, a utilizar essa oportunidade de reflectir, que a própria crise constitui» (H. Arendt, Tra Passato e Futuro, Milão, Garzanti, 1991, p. 229).

Portanto, mais do que um pretexto para um lamento e um fechamento, todos estes pontos problemáticos da convivência comum na Europa representam uma grande oportunidade para descobrir as grandes convicções que podem garantir a própria convivência. Que estas grandes convicções possam faltar não nos deve surpreender. O motivo é ainda Bento XVI que o recorda: «Um progresso por adição só é possível no campo material. […] Contudo, no âmbito da consciência ética e da decisão moral, não há essa possibilidade de adição, simplesmente porque a liberdade do homem é sempre nova e deve sempre tomar as suas decisões de novo. A liberdade pressupõe que, nas decisões fundamentais, cada homem, cada geração seja um novo início.» A razão última pela qual é preciso sempre um novo início é que a própria natureza da evidência daquelas convicções é diferente das «invenções materiais. O tesouro moral da humanidade não está presente como o estão os instrumentos que se usam; aquele existe como convite à liberdade e como sua possibilidade.» (Spe salvi, 24).
Mas decisões fundamentais acerca de quê?

3. O QUE ESTÁ EM CAUSA É SEMPRE O HOMEM
E A SUA REALIZAÇÃO

Por trás de qualquer tentativa humana está um clamor de realização. Escutar esse grito não é de modo nenhum evidente: esta é a primeira opção da liberdade. Rilke recorda-nos a tentação, sempre à espreita também em nós, de ceder à conspiração de o calar, porque «E tudo está combinado para nos calar, meio talvez / como vergonha e meio como esperança indizível» (R. M. Rilke, «Segunda Elegia», v. 42-44, em Poemas, As Elegias de Duíno e Sonetos a Orfeu, 4ª ed., Lisboa, Edições Asa, 2001, p. 174).
Quem não cede a semelhante tentação vê-se à procura de formas de poder realizar a sua pessoa, mas está sempre exposto ao risco de enveredar por atalhos que lhe parecem atingir mais depressa e de modo mais satisfatório o objectivo.
É o que, por exemplo, hoje vemos na tentativa de obter a realização através dos chamados “novos direitos”. A discussão gerada em torno destes mostra o que quer dizer o debate sobre os fundamentos e qual será o seu possível desenlace.
A partir de meados dos anos ‘70 desenvolveram-se, cada vez em maior número, os “novos direitos”, com uma forte aceleração nos últimos 15-20 anos. A sua matriz é aquela ânsia de libertação que foi a alma do ’68 – não por caso o aborto foi legalizado pela primeira vez em 1973 nos Estados Unidos e nesses mesmos anos também na Europa começavam a aparecer leis sobre o divórcio e sobre o aborto. Hoje ouvimos falar de direito ao casamento e também à adopção para pessoas do mesmo sexo, direito a ter um filho, à própria identidade de género, direitos dos transexuais, direito a que o bebé não nasça se não for são, direito a morrer, e a lista podia-se prolongar.
Muitos sentem estes novos direitos como uma afronta, um autêntico atentado aos valores nos quais, durante séculos, se fundou a civilização ocidental, em particular a europeia. Melhor dizendo: estes novos direitos exercem uma grande atracção sobre muitas pessoas – e por isso se difundem com tanta facilidade –, enquanto são receados por outros como factores de destruição da sociedade. É em torno destes temas de “ética pública” que hoje, não só na Itália mas em toda a Europa e em todo o mundo, se produzem as fracturas sociais mais profundas e as controvérsias políticas mais acesas.

Porquê esta estranha mistura de fascínio e aversão? Experimentemos perguntar-nos onde têm origem os chamados “novos direitos”.
Cada um deles nasce, em última instância de exigências profundamente humanas. A necessidade afectiva, o desejo de maternidade e de paternidade, o medo do sofrimento e da morte, a busca da identidade pessoal, etc. Cada um destes novos direitos tem as suas raízes no tecido de que toda a existência humana é constituída. Daí a sua atractividade. A multiplicação dos direitos individuais exprime a expectativa de que a ordem jurídica possa resolver os dramas humanos e garantir a satisfação das necessidades infinitas que habitam o coração humano.
O seu traço comum é que todos colocam no centro um homem que reivindica uma autodeterminação absoluta em qualquer adversidade da vida: quer decidir se viver ou morrer, se sofrer ou não sofrer, se ter ou não ter um filho, se ser homem ou mulher, etc. trata-se de um homem que se concebe como liberdade absoluta, sem limites e não tolera nenhum tipo de condicionamento. Autodeterminação e não-discriminação, neste cenário cultural, são portanto as palavras-chave da cultura dos novos direitos. «O eu contemporâneo - como um eterno adolescente - […] de limitações nem quer ouvir falar. Ser livre significa, na verdade, pôr-se em condições de poder sempre aceder a novas possibilidades […] pretendendo poder reduzir o desejo a uma fruição […] que se persegue e alcança. As mais das vezes na forma, socialmente organizada, do consumo: de bens, evidentemente, mas também de ideias, experiências, relações. De cuja insuficiência nos apercebemos logo após as termos alcançado. No entanto, todas as vezes recomeçamos do princípio, concentrando-nos num outro objecto, outra relação, outra experiência […] continuando a investir as nossas energias psíquicas naquilo que, à prova dos factos, não pode senão revelar-se decepcionante» (M. Magatti - C. Giaccardi, Generativi di Tutto il Mondo, Unitevi!, Milão, Feltrinelli, 2014, p. 14).
Esta cultura comporta a convicção de que a obtenção de sempre novos direitos seja a estrada para a realização da pessoa. Pensa que deste modo poderá evitar ou tornar supérflua a discussão sobre os fundamentos, que se poderia resumir na pergunta de leopardiana memória: «E eu quem sou?» (G. Leopardi, «Canto nocturno de um pastor errante da Ásia», v. 89). Mas não levantar a pergunta sobre o que vem a ser o sujeito, sobre o que vem a ser o eu, é como tentar curar uma doença sem fazer um diagnóstico. Então, como a discussão dobre os fundamentos é sentida como demasiado abstracta em comparação com as urgências do viver, a pessoa confia nas técnicas e normas. Esta posição foi o ponto de partida da corrida para obter o reconhecimento dos novos direitos na legislação.

Mas o ponto crítico da cultura contemporânea está na miopia com que vê as necessidades profundas do homem. Não vislumbrando a dimensão infinita daquelas exigências constitutivas do coração do homem, propõe respostas que – tanto no plano material quanto no afectivo e existencial – se baseiam na multiplicação até ao infinito de respostas parciais. Mas, como no recorda Cesare Pavese, «aquilo que um homem busca nos prazeres é um infinito, e ninguém renunciaria jamais à esperança de conseguir essa infinitude» (Il Mestiere di Vivere, Einaudi, Torino 1952, p. 190). Por isso uma multiplicação, mesmo à enésima potência, de “falsos infinitos” (para usar as palavras de Bento XVI) nunca poderá satisfazer uma necessidade de natureza infinita. Não é a acumulação quantitativa de bens e de experiências que pode satisfazer o “coração inquieto” do homem.
O drama da cultura contemporânea, então, não reside tanto no facto de, ao homem, tudo ser permitido, como nas falsas promessas e nas ilusões que essa permissividade acarreta. Cada um poderá verificar, na sua própria experiência, se a obtenção de sempre novos direitos é o caminho para a realização da própria pessoa. E vamo-nos deparar com a surpresa de que o facto de não compreender quem sou leva a reduzir a pessoa ao género, aos seus factores biológicos, fisiológicos, etc. Aqui sobressai claramente a contradição intrínseca a uma determinada concepção do homem tão generalizada nas nossas sociedades avançadas: exalta-se de maneira absoluta um eu sem limites nos seus novos direitos, ao mesmo tempo que se afirma implicitamente que o sujeito destas afirmações é, na prática, um “nada”, porque está diluído nos factores antecedentes, sejam estes materiais, naturais ou casuais.

O que é que tudo isto nos diz acerca da situação do homem de hoje? O que foi dito julga também aquelas tentativas que se opõem a esta tendência, mas sem pôr em causa a atitude comum. Alguns, na verdade, esperam de uma legislação oposta – o que, bem entendido, é sempre melhor do que uma errada - a solução dos problemas, e desse modo evitam, também eles, a discussão sobre os fundamentos. Com certeza que uma legislação certa é sempre melhor do que uma errada, mas a história recente demonstra que nenhuma lei certa conseguiu, por si só, impedir a deriva a que assistimos.
Ambas as facções partilham da mesma atitude. E a ambas se aplicam as palavras de T.S. Eliot: «Eles constantemente tentam fugir / das trevas fora e dentro de si / sonhando sistemas tão perfeitos que já ninguém precise de ser bom» (Coros de “A Rocha”, Coimbra, Tenacitas, 2014, p. 117-118), uns obtendo o reconhecimento dos direitos e outros não.
Mas a tentativa de resolver as questões humanas com normativas nunca será suficiente.
É ainda Bento XVI que o diz: «Visto que o homem permanece sempre livre e dado que a sua liberdade é também sempre frágil, não existirá jamais neste mundo o reino do bem definitivamente consolidado. Quem prometesse o mundo melhor que duraria irrevogavelmente para sempre, faria uma promessa falsa; ignora a liberdade humana.» Pelo contrário. «Se houvesse estruturas que fixassem de modo irrevogável uma determinada – boa – condição do mundo, ficaria negada a liberdade do homem e, por este motivo, não seriam de modo algum, em definitivo, boas estruturas. […] Por outras palavras: as boas estruturas ajudam, mas por si só não bastam.» (Spe salvi, 24.25).

Haverá outro caminho?

4. APROFUNDAR A NATUREZA DO SUJEITO
Só trazendo a lume o homem e a aspiração à realização que o constitui, a sua necessidade mais profunda, permite re-escrever, repensar e reviver os valores. Com efeito: «O sentido religioso parece ser […] a raiz de onde brotam os valores. Um valor, ultimamente, é aquela perspectiva da relação entre um contingente e a totalidade, o absoluto. A responsabilidade do homem, através de todos os tipos de solicitações que lhe provêm do impacto com o real, empenha-se na resposta àquelas interrogações que o sentido religioso – ou, biblicamente, o “coração” – exprime» (L. Giussani, L’Io, il Potere, le Opere, Génova, Marietti 1820, 2000, p. 166). É o sentido religioso, é esse conjunto de exigências últimas que define o fundo de todos os seres humanos, que mede o que seja um “valor”. Só a consciência do factor comum a todos os homens pode abrir caminho à busca de certezas partilhadas.
«A solução dos problemas que a vida apresenta todos os dias [dizia don Giussani há anos] “não advém directamente enfrentando os problemas, mas aprofundando a natureza do sujeito que os enfrenta”. Noutros termos, “o particular resolve-se aprofundando o essencial”» (Vita di don Giussani, Milão, Rizzoli, 2013, p. 489).
Este é o grande desafio diante do qual se encontra a Europa. A grande emergência educativa demonstra a redução do homem, o seu esquecimento, a sua falta de consciência de quem é verdadeiramente o homem, de qual é a natureza do seu desejo, da desproporção estrutural entre aquilo que espera e aquilo que consegue alcançar com as suas forças. Invocámos já a redução da razão e da liberdade; a estas acrescentamos agora a redução do desejo. «A redução dos desejos ou a censura de determinadas exigências, a redução dos desejos e das exigências é a arma do poder» dizia don Giussani. Aquilo que nos rodeia, «a mentalidade dominante […], o poder, produz [em nós] uma estranheza de nós mesmos» (L’Io Rinasce in un Incontro. 1986-1987, Milão, Bur, 2010, p. 253-254, 182). É como se nos arrancassem o nosso ser: ficamos assim à mercê de muitas imagens reduzidas e, ilusoriamente, esperamos de uma regra qualquer a solução do problema humano.
Face a esta situação, perguntemo-nos: será possível despertar o sujeito para que possa ser verdadeiramente ele mesmo, tornar-se inteiramente consciente de si, aprofundar a sua natureza de sujeito, livrando-se assim da ditadura dos seus “pequenos” desejos e de todas as falsas respostas? Sem esse despertar, o homem não poderá evitar sucumbir às mais diversas tiranias que não são capazes de lhe dar a ansiada realização.

Mas como se desperta este desejo? Não mediante um raciocínio ou uma qualquer técnica psicológica, mas unicamente encontrando alguém em quem a dinâmica do desejo se encontra já activada. A este propósito, observemos como prossegue o diálogo entre o jovem autor da carta e os amigos que têm medo da sua liberdade. O jovem, depois de escutar a descrição de todos os medos dos seus amigos, diz: «“Vocês têm razão em ter medo, são inteligentes e dão-se conta que a liberdade é uma coisa grande e difícil, e que a vida é uma coisa séria. Mas não desejam poder apreciar a liberdade? E não gostariam de poder desejar ser felizes?”. Eu disse-lhes que eu este desejo não conseguia arrancá-lo de mim! Eles ficaram uns instantes em silêncio e depois: “É isso que mais invejamos em ti, que não tens medo”. E na despedida, no fim do serão, ele disse-me: “temos de nos ver mais vezes porque quando estou contigo também eu tenho menos medo”».
Ninguém como don Giussani valorizou tanto esta experiência, tão simples quanto radical e culturalmente intensa, para responder à pergunta sobre como se desperta o eu. «A resposta que estou para dar – dizia Giussani – não é [apenas adaptada] à situação em que nos encontramos […]; o que estou agora dizendo é uma regra, uma lei universal desde que [e enquanto] o homem existe: a pessoa descobre-se a si mesma num encontro vivo [como aquilo que acabámos de escutar: “É isso que mais invejamos em ti, que não tens medo… Temos de nos ver”], quer dizer, numa presença na qual se embate e que desencadeia uma atracção, […] quer dizer, provoca ao facto de que o nosso coração, com aquilo de que é constituído […], está, existe» (L’Io Rinasce in un Incontro. 1986-1987, op. cit., p. 182). Este coração muitas vezes está adormecido, soterrado sob mil escombros, sob mil distracções, mas é despertado e provocado a um reconhecimento: existe, o coração existe, o teu coração existe. Tu tens um amigo, encontras na rua um amigo da tua vida quando te sucede isto com ele, quando te encontras diante de alguém que te desperta a ti mesmo. Isso é um amigo, tudo o resto não deixa marca.
«Aquilo de que mais precisamos neste momento da história – dizia ainda Bento XVI – é de homens que, por meio de uma fé iluminada e vivida, tornem Deus credível neste mundo. […] Precisamos de homens que mantenham o olhar voltado para Deus e aí aprendam a verdadeira humanidade. Temos necessidade de homens cujo intelecto seja iluminado pela luz de Deus e aos quais Deus abra o coração, de modo a que o seu intelecto possa falar ao intelecto dos outros e o seu coração possa abrir o coração dos outros» (A Europa de Bento…, op. cit., p. 63-64).
É então que se compreende o bem que o outro representa. Na verdade, sem o encontro com o outro – e com um determinado outro – não se poderia manifestar nem manter-se vivo um eu que se abra às interrogações fundamentais da vida, que não se contente com respostas parciais. A relação com o outro é uma dimensão antropológica constitutiva.

5. O OUTRO É UM BEM
É nesta base – a consciência de que o outro é um bem, como o demonstra o diálogo entre aqueles amigos – que se pode construir a Europa. Sem recuperar a experiência elementar de que o outro não é uma ameaça, mas um bem para a realização do nosso eu, será difícil sair da crise em que nos encontramos, nas relações humanas, sociais e políticas. A Europa deve ser o espaço onde se possam encontrar os diversos sujeitos, cada um com a sua própria identidade, para se ajudarem a caminhar rumo ao destino de felicidade a que todos aspiramos.
Defender este espaço de liberdade para todos e para cada um é a razão definitiva para ir votar nas próximas eleições para a renovação do Parlamento Europeu. Para que não mais prevaleçam as imposições por parte de alguém, mas também sem exclusões movidas por preconceitos ou por uma pertença diferente da própria. Votemos por uma Europa na qual cada um possa dar o seu contributo à construção comum, oferecendo o seu testemunho, reconhecido como um bem para todos; sem que nenhum europeu seja obrigado a renunciar à sua identidade para pertencer à casa comum.
Só no encontro com o outro poderemos desenvolver juntos aquele “processo de argumentação sensível à verdade”, de que fala Habermas. Podemos, nesse sentido, aperceber-nos ainda melhor do alcance da afirmação do Papa Francisco: «a verdade é uma relação! E tanto é assim, que cada um de nós capta a verdade e exprime-a a partir de si mesmo: da sua história e cultura, da situação em que vive, etc.» (Francisco, Carta ao Director do Jornal Italiano “La Repubblica”» Eugenio Scalfari, 11 de Setembro de 2013, p. 2). «O nosso compromisso não consiste exclusivamente em acções ou em programas de promoção e assistência; aquilo que o Espírito põe em movimento não é um excesso de activismo, mas primariamente uma atenção prestada ao outro “considerando-o como um só consigo mesmo.”» (Evangelii gaudium, 199). É só nesse encontro renovado que as poucas grandes palavras que deram origem à Europa poderão voltar a ser vivas. Porque, como nos recorda Bento XVI, «as melhores estruturas só funcionam se numa comunidade subsistem convicções que sejam capazes de motivar os homens para uma livre adesão ao ordenamento comunitário. A liberdade necessita de uma convicção; esta não existe por si mesma, [nem pode ser gerada por uma lei], mas deve ser sempre novamente conquistada comunitariamente» (Spe salvi, 24). Esta reconquista das convicções fundamentais não se consegue senão no seio de uma relação. O método pelo qual vieram plenamente à luz as «convicções fundamentais» (pessoa, valor absoluto do indivíduo, liberdade e dignidade de todos os seres humanos…) é o método pelo qual podem ser reconquistados, não há outro método.

Nós, cristãos, não temos medo nenhum de entrar, sem privilégios, nesse diálogo em toda a sua amplitude. Esta é para nós uma oportunidade preciosa para verificar a capacidade do acontecimento cristão de se manter firme diante dos novos desafios, oferecendo-nos a oportunidade de testemunhar a todos o que sucede na existência quando o homem intercepta o acontecimento cristão ao longo dos caminhos da vida. A nossa experiência, no encontro com o cristianismo, mostrou que a linfa vital dos valores da pessoa não são leis cristãs ou estruturas jurídicas e políticas confessionais, mas o acontecimento de Cristo. Por isso, nós não depositamos a nossa esperança, para nós e para os outros, em mais nada senão no renovar-se do acontecimento de Cristo num encontro humano. Isso não significa, de modo algum, contrapor a dimensão do acontecimento e a dimensão da lei, mas reconhecer uma ordem genética entre elas. Aliás, é precisamente o renovar-se do acontecimento cristão que permite que a inteligência da fé se torne inteligência da realidade, de maneira a poder oferecer um contributo original e significativo tornando vivas as convicções que podem ser introduzidas no ordenamento comunitário.
É esta a ideia específica que está no centro da Evangelii Gaudium: a constatação de que no mundo católico a batalha pela defesa dos valores, com o tempo, se tornou tão prioritária que acabou por parecer mais importante comparativamente à comunicação da novidade de Cristo, com o testemunho da Sua humanidade. Esta troca entre antecedente e consequente documenta a queda “pelagiana” de tanto cristianismo actual, a promoção de um cristianismo “cristianista” (Rémi Brague), privado da Graça. A alternativa não reside, como alguns lamentam, numa fuga “espiritualista” do mundo. A verdadeira alternativa é, antes, como temos visto, uma comunidade cristã não esvaziada da sua espessura histórica, que oferece o seu contributo original «despertando nos homens, através da fé, as forças da autêntica libertação» (Bento XVI, in Accanto a Giovanni Paolo II, Milão, Ares, 2014, p. 18).
Quem está comprometido na esfera pública, no campo cultural ou político, tem o dever, como cristão, de se opor à deriva antropológica actual. Mas esse é um compromisso que não pode envolver toda a Igreja enquanto tal, que tem hoje a obrigação de ir ao encontro de todos os homens, independentemente da sua ideologia ou filiação política, para testemunhar o “atractivo de Jesus”. O compromisso dos cristãos na política e nos meios onde se decide o bem comum dos homens continua sendo necessário. De resto, através do modelo da doutrina social da Igreja, esse compromisso mostra as fórmulas de convivência partilhada que a experiência cristã verificou. Hoje é mais importante do que nunca. Sem jamais esquecer que nas circunstâncias actuais tal compromisso assume, em sentido paulino, mais um certo valor katecôntico, ou seja, crítico e de contenção nos limites do possível, dos efeitos negativos das meras normativas e da mentalidade que as produz. Não pode contudo presumir que da sua acção, por meritória que seja, possa mecanicamente surgir a renovação ideal e espiritual da cidade dos homens. Isso nasce «daquilo que vem antes», que primeireia, de uma humanidade nova gerada pelo amor a Cristo, pelo amor de Cristo.

É esta consciência que nos permite ver as limitações das posições de quem julga conseguir resolver tudo por meio de normativas ou leis, de uma determinada facção ou da oposta, e por isso pensa que defender um espaço de liberdade é demasiado pouco. Muitos gostavam que a conquista dos direitos ou a sua proibição fosse garantida pela política. Assim escusavam de «ser bons», para usar as palavras de Eliot. O que nos ensina o facto de «nem o esforço, verdadeiramente grandioso, de Kant [ter sido] capaz de criar a necessária certeza partilhada»? O que aprendemos da nossa história recente, tendo visto que não têm bastado leis boas para manter vivas as grandes convicções? Há um longo caminho a percorrer para chegar a uma «certeza partilhada» (A Europa de Bento..., op. cit., p. 62).

A longa marcha que a Igreja percorreu para esclarecer o conceito de «liberdade religiosa» pode ajudar a compreender que defender o espaço dessa liberdade talvez não seja, afinal, tão pouco assim. Após um longo e atribulado processo, no Concílio Vaticano II, a Igreja chegou a declarar que «a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa», justamente ao mesmo tempo que continua a professar o cristianismo como única «religião verdadeira». O reconhecimento da liberdade religiosa não é uma espécie de pacto, como se se dissesse: uma vez que não conseguimos convencer os homens de que o cristianismo é a religião verdadeira, defendamos ao menos a liberdade religiosa. Não, a razão que levou a Igreja a modificar uma praxis que durou séculos, muitos séculos, foi o aprofundamento da natureza da verdade e da via para alcançá-la: «A verdade não se impõe a não ser pela força dessa mesma verdade». Era esta a firme persuasão da Igreja nos primeiros séculos, a grande revolução cristã fundada na distinção entre as duas cidades, entre Deus e César. Uma persuasão destinada a atenuar-se depois do Édito de Tessalónica (380 d. C.) por obra do imperador Teodósio. Com o regresso ao espírito da Patrística, o Vaticano II pode afirmar que «todos os homens devem estar livres de coação [...] de tal modo que, em matéria religiosa, ninguém seja forçado a agir contra a própria consciência, nem impedido de proceder segundo a mesma, em privado e em público, só ou associado com outros, dentro dos devidos limites.» E por fim: «Este direito da pessoa humana à liberdade religiosa na ordem jurídica da sociedade deve ser de tal modo reconhecido que se torne um direito civil.» (Declaração sobre a Liberdade Religiosa Dignitatis humanae, 7 de Dezembro de 1965, 12). Se isto se deve dizer sobre o direito maior, quanto mais para todos os outros!
Só se a Europa for um espaço de liberdade, onde cada um possa estar livre de coação, fazer o seu próprio caminho humano e compartilhá-lo com quem encontra no caminho, se poderá redespertar o interesse por um diálogo, por um encontro em que cada um ofereça o contributo da sua experiência para atingir aquela «certeza partilhada» necessária para a vida em comum.
O nosso desejo é que a Europa venha a ser um espaço de liberdade para o encontro entre aqueles que buscam a verdade. Para isso vale a pena comprometer-se.