Jesus Cristo, a fé, a matemática
Retirado de «La Repubblica», p. 19Uma noite de inverno no seminário, depois do jantar (na época havia cerca de uma hora de tempo livre), Enrico Manfredini, junto com um outro companheiro, De Ponti (morto prematuramente, nove meses antes de celebrar sua primeira Missa, quando os seus pais camponeses já haviam colocado um laço na planta de trigo que serviria para preparar a Hóstia para a primeira Missa e marcado com um outro laço a videira que produziria o vinho), chegou perto de mim e me disse: “Escuta, se Cristo é tudo, o que tem a ver com a matemática?”. Nós ainda não tínhamos 16 anos. Daquela pergunta, para a minha vida, nasceu tudo. Aquela pergunta direcionou, como iniciativa orgânica, tudo aquilo que a minha vida seria capaz de dar, em termos de pensamento, de sentimento, de produtividade.
“Se Cristo é tudo, o que tem a ver com a matemática?”. A pergunta pode ser imediatamente sentida como ingênua, mas, por mais que seja ingênua não atenua, em quem a ouça com atenção, a impressão profunda do problema que ela coloca. É como se toda a nossa fé fosse colocada e deixada em suspense naquela pergunta. O Verbo de Deus, aquilo de que tudo consiste, tornou-se homem: aquele homem, do qual líamos nas páginas comoventes do Evangelho de São João, aquele homem que André e João seguiam (“E foram à sua casa e ficaram horas olhando-O falar”; e depois foram para casa e estavam mudados, eram tão diferentes que os vizinhos perguntavam a eles: “O que aconteceu com vocês?”) Com esse Cristo, do qual João e André reconheceram primeiro, realmente tudo tem a ver. (...)
Porém, quero insistir no sublinhar que não era ingenuidade aquela que nos animava, mas uma intensidade de interesse, sem comparação, pelo fato cristão. Naquela noite o fato cristão desabrochou para nós. Com que seriedade tais pensamentos determinavam, na vida cotidiana, a escola, o tempo livre, os diálogos entre nós! Criaram uma amizade contínua que nos acompanhou sempre. (...)
O conteúdo dos diálogos entre nós três era todo ditado pelo fervor que aquela pergunta tinha feito nascer. E posso dizer, ingenuamente, mas diante do Senhor, que entre aquilo que imaginávamos do nosso futuro e a realidade do futuro como aconteceu não consigo ver a diferença. Por exemplo, entre nós se dizia: “É necessário que a Igreja reviva, é preciso que a realidade cristã seja mais consciente (estávamos na terceira série do ginásio, mas a pergunta pôde nascer porque já estávamos a uma certa profundidade de amizade); é preciso que a Igreja, para reviver, crie comunidades; tantas comunidades que, ligadas umas à outras, transformem a vida social, a forma da vida social, dêem uma nova ordem à vida comum, tornem mais humano o caminho do homem sobre esta terra”. São as mesmas coisas, idênticas, que agora procuro repensar e, portanto, viver: a Igreja que se torna presente por pessoas com quem se fala a sério de Cristo, se imposta a própria vida como verificação disto, se cria uma trama alegre de relacionamentos entre companheiros por causa disto. (...)
Devemos admiti-lo, se Deus se tornou homem... Lembro-me uma vez na escada (do seminário; ndr), enquanto estávamos descendo para a igreja em silêncio, Manfredini me disse: “Porém, e pensar que Deus se fez um homem como nós...”. Interrompeu a frase, com a qual fiquei marcado: “Que Deus tenha se tornado homem é uma coisa do outro mundo!”. E eu acrescentei: “É uma coisa do outro mundo que vive neste mundo!”, pela qual este mundo se torna diferente, mais suportável. Torna-se mais belo. De fato, da paixão por Cristo – aquela que, por assim dizer, sucedeu imediatamente, quase queimando o terreno sobre o qual antes florescia – veio a paixão pelos homens, a paixão pelo destino dos homens, a paixão pelo sentido da vida que os homens não conhecem, à qual os homens não pensam. “Quem sabe – dizia, não digo chorando, mas quase – o que será destes jovens que passam pelos oratórios, quem sabe o que será das pessoas que vão à Igreja, se não compreendem que aquilo que reverenciam, aquilo pelo qual rezam, aquilo que pensam, representa o significado daquilo que vivem, de cada dia em que abrem os olhos! Se não pensam nisto, que vida levam? Quando a objeção surge ou quando a alternativa à sede de felicidade e de prazer se afirma, como poderão viver? Como podem viver?”.