(Foto: Unsplash/Kelly Sikkema)

Prosperi. Comunicar todos os dias a beleza que encontramos

O 46º Dia Nacional da Vida convocado pela Igreja italiana. Eis a contribuição do Presidente da Fraternidade num número especial do jornal “Avvenire” de 4 de fevereiro
Davide Prosperi

O Dia Nacional da Vida reduz-se com frequência a uma contraposição entre uma minoria que defende o valor da vida, especialmente nos seus momentos mais frágeis (gestação, nascimento, deficiência e velhice), e uma maioria em grande parte indiferente, mas capaz de momentos de forte reivindicação (política, mediática e agora cada vez mais também jurídica), sobre temas como eutanásia, aborto e novos supostos direitos. Acaba-se assim por não escutar e não compreender o outro.

As duas partes são paradoxalmente semelhantes ao enfatizar valores como acolhimento, compaixão, acompanhamento e piedade, chegando porém a conclusões diametralmente opostas. O mesmo, embora em termos diferentes, acontece com guerra ou imigrantes, outros temas colocados no centro do Dia Nacional da Vida: todos querem a paz, mas qual é a paz mais justa? Enquanto se discute, morrem homens, mulheres e crianças inocentes. Enquanto isso, apesar dos apelos ao aumento da natalidade, os abortos no mundo são mais de 40 milhões por ano e as mortes por eutanásia e suicídio assistido têm vindo a aumentar. Uma verdadeira hecatombe “voluntária”. Muitos debates e muitos bons propósitos, mas no fim o homem continua a fazer o que quer: dos outros e dos mais fracos sobretudo, mas também de si mesmo. Querendo criar um mundo sem Deus, o homem põe-se no lugar de Deus. O resultado é quase sempre a violência, a eliminação de quem incomoda. É o mesmo engano utópico experimentado com as ideologias totalitárias que persiste de uma outra forma.

Para os cristãos do nosso tempo, apresenta-se então a mesma alternativa que se perpetua desde os tempos de Cristo: Jesus ou Barrabás? O poder de Deus ou o do homem? Isto, a meu ver, é o cerne do Dia Nacional da Vida: a vida é mistério porque se vê e se sente, mas não se possui. Como dizia don Giussani: «Se neste momento eu estou atento, isto é, se sou maduro, não posso negar que a evidência maior e mais profunda que percebo é que eu não me faço por mim mesmo, não me estou a fazer por mim. Não me dou o ser, não me dou a realidade que sou, sou “dado”». O problema da presença de Deus como fator determinante da vida não pode ser então reivindicado reduzindo-o a uma contraposição ideológica. Jesus, morto e ressuscitado por todos, revelou o senhorio amoroso de Deus sobre a existência. Trata-se então de imitá-Lo, testemunhando «a força surpreendente da vida».

Trata-se, como cristãos, de comunicar a beleza que encontramos e que, mesmo com as dificuldades de todos, todos os dias redescobrimos. O Dia Nacional da Vida pode tornar-se assim um grande momento para documentar aquilo de que o coração do homem precisa: Alguém que o faça ressurgir, que o salve para sempre. Mesmo no limite e na dor. Afinal, «tudo flui», como disse V. Grossman, mas a glória de Cristo, humilde e sofrendo na cruz, a mesma glória de uma mãe que vê seu filho sofrer na doença e com ternura o acompanha testemunhando-lhe a esperança do amor, a glória do doente que oferece a Deus o significado misterioso de seu mal pela salvação de cada um de nós, essa glória não se apaga. E é essa glória que muda o mundo.

Extraído de Avvenire